segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Os olhos de poeta são determinados como os do Diabo.

Mas os meus olham bonito até o feio
E o esquisito.

Quer isto dizer que, pelas linhas que escrevo,
O poeta quer sair e assim o oiço
E concordo de que o sou,
Também, poeta sim.

Não o é fácil ser pois é todo oposto
Ao pragmatismo dos mercados.

Mas, enfim, carrego isto
Porque já faz parte de mim.

Sossego quando assim penso
Pois não lhe resistindo
Sinto-lhe apresso.

Preciso me expressar e manifestar.
Senão pela fala e gesto
Pelo dom mágico da escrita.

A arte está ainda em todo o lugar
Físico e material.
É só largar no chão todo o preconceito
E partir para a vida solto e leve.
Escutando e lidando com ela
A cada sopro.

Parece que não há
Então a despedida do poeta…

Como? Se ele hoje é tão eu
Como o eu que os outros vêem em mim?

Escrevo para me acompanhar em todo o lugar.
E assim o sozinho é sempre abrangente
Por não estar só.

Claro que há sempre um peso no peito,
Talvez por angustia de não voar
Ou de me resguardar tanto do barulho alheio.

Mas creio que se o aceitar
E o ajudar ele se irá deslargar de mim,
Aos poucos, encontrando outro lugar onde pousar.

As dores físicas são do coração
Que não dá o que pode e quer dar.
Pois a mente, coitada, que para viver
Tem que mentir ao coração…

Um pouco agora, depois menos, talvez,
E ainda depois, se calhar, esquece
E deixa de mentir.

Quero que o meu corpo, mente e coração
Se unam num só viver,
Num só sopro e movimento.

Gostaria de conseguir isto.

E já que hoje creio que crer e querer
É realmente poder posso alcançar isso.

Escrevo para a vida.
Escrevo para ajudar-me a vivê-la.

A arte, para mim, se não serve a vida
Então não tem fim.

Não me venham com tragédias,
Dramatizações e decadências
Em fórmula de preconceito intelectual
Pois isso pertence ao século passado.

Hoje vive-se.
Vive-se a vida já sem grandes ideais,
Se procura um belo que nela sempre há.

Pois que por mais que pequena, a beleza actual,
Ainda se chama beleza e é por nós correspondida.

Assim sendo, o papel de quem cria
É e será amplificar essa mesma (pequena) beleza
À grandeza da essência a que ela, claro está,
Ainda remete.

Há que ser forte, responsável, sereno e sóbrio,
Pois é a única maneira actual de não se deixar cair
A alma universal.

Passo a passo, com calma
Mas perfeita determinação,
A vida se fará.

Há beleza ainda…

Escuta-a e não a olhes pois ela é tímida.
A única felicidade que há
É aquela que não resiste
À infelicidade.
Deus de um coração
Frágil mas forte.

Assiste-me a vida
Julgando-me louco
E louco sou, certamente,
Um pouco
Mas a questão é…
Que se tem de o ser
Para se viver
A vida como ela é.

Descuidos parvos
E as certezas a se afastarem
Para o longe.

Um passo certo
Dado em sincronia
Com o espaço.
Pois é no espaço,
Este que piso agora,
Que quero viver.

Tempo houve
Em que não havia que sofrer
Mas hoje, também,
Se sofrer
Não mais já sofre só.
Há além do sofrimento
E assim sorrimos
Desconhecidos
Uns aos outros.

Enviesadas linhas
De meu destino
Correm soltas
Enquanto eu
Pernoito o dia
Em bocejo de pensador
Acção física de o não pensar.

Tenho eu o meu lugar neste mundo,
É só o tentar.
Quando a porta se deixa ficar
E encanta o trunfo a encontrar
O norte é sem fim.
A vida de poeta é encantada
Em grande medida
Pela tristeza aceite.

Quem aceita a tristeza
Faz dela
A sua vida encantada.

É uma vida recheada de fumo
Que guarda a vida interior.

Sem dor
O poeta não cria.
Se não cria
O poeta não vive.

Há que não resistir
E ser uno com a vida.  
Fernando Pessoa é dos maiores Shamãs da era moderna! Pode-se crer nele como num Deus. Ele recebe a nossa súplica e a reflecte em ironia infantil libertando-nos do nosso ridículo protagonismo. Com ele a vida não pesa tanto porque pesou-a ele toda na sua vida. Fernando Pessoa é (um) Deus.
-
(Aconselho toda a sua prosa, isto é, escritos íntimos e obras inacabadas como, por exemplo: A Hora do Diabo, Fausto, O Banqueiro Anarquista, o Marinheiro, o Livro do Desassossego, Páginas Intimas e de Auto-Interpretação, Notas para Recordação do meu mestre Caeiro e por fim toda a "Obra em Prosa de Fernando Pessoa" com o prefácio, introduções, notas e organização de António Quadros. Este último é um conjunto de 7 livros, de umas 200 paginas cada um, em que o poeta escreveu sobre os mais variados temas, como: Politica, Astrologia, Esoterismo, Sebastianismo, Portugal, portugueses, o 5º Império, Cartas intimas (entre ele e Ofélia - namorada dele - nomeadamente), Intervenção Social, Literatura, Estética, etc ETC etc ETC etc ETC  etc!!! )

domingo, 25 de novembro de 2012

Hoje, no recital do apreço,
Eu bronzo-me de velho
Para me guardar novo,
Por me oferecer,
Como presente,
A quem me quiser.


Gero a minha própria profecia
Aguardando o dia
Em que serei livre disto aqui.

A vida demora
E demoro-lhe eu a chegar.

Agora, está ela toda
À minha volta e no entanto
Parece pecado tocar-la.

Porque tenho que ser outro?

Perguntas bem…

As verdades são
Para ser ditas no papel
Para que fiquem eternas.

Longe de mim
Querer atiçar o presente
Com o meu júbilo.

Ainda não é tempo.
Aguardo o momento,
Aguardando-o para sempre
Se assim tiver que ser.

A minha luta é tão velha,
Tão cansada, e no entanto
Tenho que a prosseguir.

Tremo todo de energia.

E o palácio que concebo
Não me dá alegria física.

Por parte, não sei de mim…

Fujo do que procuro,
Procuro o que não encontro.

Avizinho-me do limbo
Para me sentir vivo.

É que tenho demasiada energia
E o fim dela
Seria o começo nela.

As verdades
Que uma alma sente
Devem ser guardadas
Para serem lançadas
Ao vento
Como cinzas físicas.

Um começo no futuro
E um encanto
De profecia
Hiberna-me a vida
À maravilha.

Estou cansado de poder.

Podendo, me viro,
E vou contra o vento.

Amanhã aguarda-se em silêncio
E o meu de cá vai para lá,
Bem longe,
Sinceramente.

Portugal quer-me poeta
Não aceita que eu viva.
Pois tanta vida
Não encontra violeta
Num país tão pequeno.

Assim, meu filho,
Assim sei que é lá,
No longe e desconhecido,
Que eu irei viver.
 Prezando tudo como deve ser.

A noite terá medo ao principio
Mas o dia sempre logrará.

E na véspera de uma nova Era
Eu aguardo-a sorrindo,
Emprestando a minha mão à outra.

Recorrendo a portas
Que não são
Caminho para um tempo sem senão.

Lembras-te de quando
Vivíamos e isso era lindo?

Hoje parece feio
Porque está feio o presente.

É domingo.
O dia mais tenebroso de todos.
Domingo, o dia da família maldita!

Domingo então
Não é para todos
Mas para os que tiveram sorte.

Perdi a graça
Agora que te foste novamente.

Já não me sei
Recordar da tua pele
E voz.
Assim é mais difícil.

Incrível como estamos ligados
Ligados ao ventre do universo.

O passado gera presente
Pela alquimia de o reinventar futuro.

Vivo ao contrário
Porque é ao contrário
Que a vida me parece permitida.

Ser poeta é o dever
De quem sente
O seu direito à vida
Vedado, negado.

Não posso viver
Como tu, ó tu,
Na encruzilhada da sobriedade calma.

Demónios hereditários
Me amaldiçoaram
E por eles me deixei
Fecundar só para os depois ganhar.

Fazem-se lutas
Para entreter o tempo
Enquanto o coração aborrecido
Aguarda entrega.

A morte está em mim
Apenas para conseguir
Fazer da vida a minha sina.

Na luta do tempo
Aguarda-se novo pensamento.

Vivo para ela, ainda.
Mas vivo para mim também,
Só para mim.

Assim, na solidão suprema,
Invento o que não existe
Para existir em ideal talento.

Tenho de me meter
Cá dentro à porrada
Tal é a pulsão de vida.

A guerra faz-se em maresia
De conceber o fruto
E não o comer.

Quem me fez
Fez algo maravilhoso.
Tão maravilhoso,
Que não consigo aguentar.

Entorto-me então
Para que torto
Vire a vida
A uma saúde dúbia e esquecida.

Estou sempre instável,
Sempre a brotar
Como se frutos
Fossem água do meu ser.

Amanhã,
Promessa de quem não vem.

E o tempo
Esse é uma lembrança
Vivida no depois de morta,
Esquecida.

Quem lembrou
Depois esqueceu.
E quem perdeu,
Bem, quem perdeu,
Ganhou a eternidade.
Nunca me esqueças
Mas esquece-me completamente
Para poderes amar novamente.
Toca-me por favor.

Vivo no ar
E não compreendo
A minha condição física
Se não me tocares.


Então toca-me
Por favor.

As ordens de
Minha imaginação
São terríveis.
Querem-me longe
De tudo o que é real,
Perto de tudo
O que vive para sempre.

Amanhã cai o sol
Do horizonte
Em negra noite poética
E os meus sonhos
Comem-me vivo,
Felizes crianças egoístas.

Se soubessem a
Angústia em que vivo
Por ter sofrido
O inimaginável|

Parece que só
Tenho a servir
Essa memória
E nada mais.

Escrever é a minha sina.
Escrever e escolher
O que é por mim escolhido
Sem eu ter nada a dizer.

Que pena tenho
Em não conseguir
Ser coloquial e físico
Como são os outros.

Meti-me nisto
De escrever por saber
De algo do qual
Não me queria esquecer.

Assim vivo sempre
Lembrando e esquecendo
A cada momento.

Vivo no esquecido de mim.
Tentando encontrar
A não procura.

E quem me poderia
Ajudar não sabe quem sou.

E quem me tenta ajudar
Só me faz sentir pior.

Onde está o ninho,
O sobreiro da vida
Promessa adolescente?

Caí pela secta do amor,
Para dentro, sem calor,
De um covil
Frio e mal cheiroso.

Lá enfiado,
Vendo que impossível a saída,
Habituei-me a ele
E ele a mim.

Começou a falar comigo.

Um covil a falar,
Imagina-se ó gente?

Ainda lá enfiado
Me chamam à vida
Mas ela…
Tão longe.

Preciso de uma mão.
Aquela mão doce
E voadora do amor.

Sem ele, quem sou?
Certamente nada
É o que sou.

Ó céu, terra, mar
E vento
É de amor
Que eu careço.

Bem vindo seja ele.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Lúcia. O cheiro a naftalina entre roupas e lençóis silenciava o grilo que cantarolava no jardim, tal era a agressividade com que se entranhava nas narinas. Aquele aroma era parte de um toque, jeito tão caracteristico, que fazia renascer em si o sorriso.
Lourenço. Tão pequeno que era e tinha como da terra ao céu tanto de loucura como de coragem. Parecia que o diabo lhe tinha aberto o conteúdo e arrancado os sentimentos à colherada. Sufocava no meio das palavras que não lhe saíam por viver as emoções em silencio.
Um dia, disse que o amor não passava de uma pequena atitude que com o tempo daria lugar a um vazio meramente preenchido pelo respeito, enquanto os ideais permanecessem firmes. Mesmo assim, Lúcia continuava a amá-lo como melhor sabia fazer. A exuberancia dos seus gestos era única, ela olhava-o sem pestanejar, admirando o modo como barrava manteiga nas torradas, todas as manhãs, achando que era essa a forma delicada com que pincelava a vida. Às vezes, parecia perceber de tudo, ao ponto de saber sempre o certo e o errado, como que por instinto. Foi Lourenço que lhe mostrou a importância de se ter braços firmes e de deixas as gotas de suar fluir pela cara, em dias de trabalho sob calor estival. Também foi Lourenço o primeiro a mostrar-lhe o cheiro a terra húmida. Prometia-lhe todas as noites "sopinha de canja", sua preferida, para o jantar e Lúcia vivia os dias ansiando esse momento. Queria o futuro todos os dias, um futuro que vinha sempre às sete da tarde. Juntava as bolinhas de massa na borda do prato e fazia um sorriso, porque era um sorriso que se formava no seu estômago daquela forma, se comesse tudo. Depois, cresceu e desiludiu-se quando percebeu a digestão dos alimentos. Pormenores sem importância numa vida repleta de digestões enfadonhas ou leves, conforme se temperam os dias.
O tempo passou uma rapidez que ninguém entende e hoje Lúcia não o tem, nem o sabe, porque desapareceu entre documentos e pressas, sem lhe dar, sequer, um beijo. No entanto, quis ficar enroladda naquela cama de 1964, como se fosse buscar aos sentidos algo que lhe pertencesse, como se a Natureza lhe segredasse de forma clara e óbvia que ele, agora, era um átomo translúcido que pairava na invisibilidade do ar.
Desculpa, não tive outra hipótese. Entre vapores de naftalina precisava que conhecesses esta filha que não sabias ter, que não cuidaste com carinho nem ensinaste a andar de bicicleta. Achei que estivesse na hora, não podia adiantar mais, porque sinto-me merecedora de também poder querer, todos os dias, um novo futuro, às sete da tarde. Que horas são, afinal?


Lido na revista LER nº118 na secção 15/25 (onde se promovem textos de autores desconnhecidos dos 15 aos 25 anos de idade).
Gostei tanto de ler este que tive de o aqui expor e partilhar.
Ele é de uma tal Jeniffer Jesus, de 20 anos e de Santo André de Vagos, Aveiro.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Que quando as portas
Guincham
É quando elas são realmente velhas
E importantes.


Há que torcer a vida,
Esganiçá-la, se necessário,
Para fazer andar o meu sonho.

Rebelo-me dentro de mim
Enquanto assusto os outros
Com minha sobriedade de espírito.

Há que ser sozinho também,
Pois os outros levam-nos por caminhos
Que não sei.

E eu sei,
Sei muito!
(finge saber…)

Ó da casa
Não é que ela é tua
E eu, sendo eu, não a posso viver?

O desconforto que há
Nessas casas embrulhadas
Como presente
Sem nunca se abrir
Se morre lá dentro.

Ó alegria de partir!
Ser um outro
Sem o ter de ser.

Fantasmas se movem aqui e ali.
Fantasmas que consigo tocar, atenção.

Como já um outro eu,
Que fui, disse:
“nowadays dead people are more alive
Then alive ones”.

Que prejuízo levo da vida?

Nenhum claramente.

Assim, é ser outro
Constantemente
Enquanto o são
Escreve porque se esquece
(e daí aparece).

Não há melhor amigo
Ou amiga
Que a minha escrita.

Sou um tolo
Que resolve o negativo
Em positivo
Sem saber somar.

Como?

Não me defendo,
Só ataco.

Se não os outros
Ataco-me a mim mesmo.

Que sou eu
Senão a cinza
De um já passado eu?

Lembro-me de mim
Quando me esqueço
A escrever (sobre mim).

À noite recordo
O meu principio
De ser alado, fantástico
E assim a morte que me assiste
Reconhece-me mais que vivo,
Pois a venço.

Uma luta infernal
É diariamente executada dentro de mim.

Porquê?

Perdi tudo
E continuei assim,
Assim como, ao que parece, sou.

A vida é um divertimento.
Pois o sangue
Que me sustenta o corpo
Mantém também, bem vivo,
O meu cérebro.

Aquele intestino maravilhoso
Que invés de cagar
Inventa e sonha.

Que coisa maravilhosa!

Oh, não me toques.
Com essas vestes de ser actual
Poluis a minha aura universal.

Desculpe minha senhora
Mas é preciso ser louco
Para se manter a vida sã.

Um louco simples
Que se dissimula
Vestido de menino
E bem educado.

Ah mas que graça…
Por momentos, agora,
Fiquei pensando
Que isto que escrevo
É realmente louco e absurdo.

Não sabe o menino
Que o único medo
Que existe é o medo em si?

Sejamos guerreiros
Se não de pátrias, fronteiras,
Culturas ou tribos,
Do reino mental que é
Como dizer
Espiritual!

Que culpa tenho
De conseguir erguer estruturas orgânicas
Em plano virtual?

A angústia de viver
É coisa que se não pode ter.

Ir em frente
Sempre.

Parar um pouco
Com o amor
E o salgado sexo
E continuar .
Abrindo espaços incógnitos
Que não reconheçam humanidades.

De uma coisa
Eu estou certo:
Não me responsabilizo pelo que escrevo.

Escrevo o que sai,
O que tem de sair
Para conseguir eu
Viver a vida
Que tenho em mim.

Que se fodam as edições de autor!

Quero voltar aquela época
Em que o criador
Era incógnito
E não assinava o que criava!

O que interessa a individualidade
Quando o que se alcança é a universalidade?

Ó, que tou farto de bestas
Que querem saber quem os salvou!
(salvou de quê?)

Foi a vida,
Somente a vida.

Quem a criou
Apenas a escutou.

Está tudo dito.
É curioso como para escrever é precisa tão pouca energia fisica.
Daí quem escreve é escrito pela imaginação.
Nunca nada em mim de bom
fica por muito tempo.
É-me portanto
como que divino
quando o experencio.
Quando a porta do lado se abre
E aperta o coração
Que sereno estava à porta de outra.


Vão-se sonhos embora
E começa uma luta atroz
Que penetra a pele
E engole o choro em agonia de ódio.

Por parte da estátua fria
O corpo humano
Se dissimula em sensualidade.

E a, para sempre,
Fonte da vida
Lembra por partes desconhecidas
O caminho a tomar.

Claro que é agreste a vida
E claro que não é fácil.

As decisões correm aos milhares
À praça da consciência
E a cara fica apática, muda.

Enlouquece a esfinge.
Mente o carro
De noite sem faróis.

E um eu de ele ali
Foge ao encontro da vida.

Pudesse o sonho
Preservar sua unanimidade circunstancial
E a pedra voaria.

São catástrofes do tempo
Em que se avizinham amigos,
Amores e família.

Hoje fica o nada,
Vai o tudo
E o humano que se encarregue
De lidar com isso.

Foge o tempo
Para outro tempo e espaço
E fica seguro o pensamento.

Na parte de baixo trabalha-se
Enquanto que na parte de cima
Bebe-se gin e whisky
Para fingir prazer.

O chão largou velas há muito.
Foi para longe.

Quem vive hoje
Não está seguro.
Procura um tecto
Que o não reconhece.

Talvez afectos curem a vida
Ou então sejam os outros que a iludem à distorção.

Coerência é o difícil de conseguir
E o amanhã de aqui
Olha em silêncio para ali.

Fugimos do amor,
Da vida e de tudo o mais
Porque hoje dói viver
(lembra o que se esteve e sempre se estará a perder).

Toca o sino da igreja,
Bate a bota do trabalhador da cortiça,
Grita o porco que é esfaqueado…

Tudo presente,
Tudo no além do aqui.

Há portas que nunca deviam ter sido abertas
E há chão que se deve não pisar,
Regras que não são para trespassar.

Mas também,
Meu querido e minha querida,
O que mói na vida
É o não a derradeiramente (poder) sofrer.
É escutar e aguardar
A chamada da vida.

Olha que ela chama
Diz-me uma voz terna
Só por mim ouvida.

É preciso estar atento
Diz outra de mais longe.

Ó meus anjos
E diabinhos
Onde me trouxeram!

Sou uma fada generalizada
Com pila e barba de homem.

Porque me fizeram
Então tão feminino?

Não sei do tempo
Em que pisava o chão...

Então não sei do tempo,
Ponto.

Sei talvez do espaço
Mas não sabendo do tempo
Só os olhos vêem esse espaço
(Onde meu corpo deambula).

Vendo o espaço
Mas não se sabendo do tempo
Ele é como se também não existisse.

A noite é longa
E os pássaros me encantam
Com seus chilrares tão bonitos.

Toca o sino da Igreja
De minha terra.
Adoro ouvi-lo...

Nunca acreditei em nada
Mas sempre acreditei em tudo
E a vida que levo
Não procura nada senão inventar futuro.
Compasso erguido,
Fria lua do consolo
Desenrolo-te nua,
Fêmea dos prazeres dionisíacos.

Foste tu prima do sol talvez?

Em parte, por parte,
Olhei-te em seguida.
Fingiste-te de mim
E te mais não vi.

O que faço aqui só?

Aos trambolhões deambulo.
Pretas escadas que desço
Para encontrar porta?

Invento escadas então
Que subam e deixo o chão
Para os que já são.

Eu, repito, vou sendo!

O caminho se faz o esquecendo.

Curioso que amigos meus dizem-me:
Conheci-te há um ano,
Conheci-te há 10.

Fico a pensar então o que é o tempo...

Será que ele passa realmente?

Eu nunca me lembro
E continuo em frente
Como se nada houvesse senão
O meu grito silencioso.

Talvez amanhã.
É.
Talvez para mim
O futuro seja o que o passado é para os outros.

Olho, endeusando-o,
E corro-lhe atrás.

Corro (para a frente)
Mas é como se
Fosse ao encontro do passado.

A harmonia é total
E os pássaros que agora chilram
O confirmam.

A minha glória à vida
É que a sinto.
A cada momento,
A cada pulsar a acaricio
Com as minhas mãos frias
Que guardam um coração quente.

Ter tempo para gesticular a fantasia.
Digerir-lhe os excessos
Metamorfoseando-os em vida que possa ser
Vista, sentida, vivida.

A vida não pára
Mas pára-a o artista com sua arte.

Não fácil parar a vida...

Amanhã?
Veremos...

O que me diz o amanhã?

Diz: " está descansado
Que não tarda e tarda muito."

Bonito.
Viver é raro.

Pisa-se o chão sem querer.

Quando se vive
Não se pisa o chão
Se não se o é também.

Amanhã cai pela manhã
Enquanto a lua,
Dia feito,
Ilumina a noite do sonhador.

Palavras sangradas pelo coração,
O adeus de mão em mão.

Joguei-te ao ar
E onde foste tu parar?


Lembro-me como se ontem...
E ontem foi.

A saia que vestias
Quando descias
Ela subia
E via-te eu as cuequinhas.

Sabia lá
Que mais tarde era lá
Que se escondia a tua derradeira porta.


Fui um outro durante anos
Depois lá te perdi
E em pânico te busquei amiga.

Deixei essa tua bela
E molhada porta
Para outros e te abracei
Como mãe de mim,
Filha de ti,
Como amor e sorri.
Sorri finalmente!
Faz-se o caminho à porrada enquanto, por dentro, sangra um coração sedento de dar. Sou eu uma pedra que quando acariciada por quem quero derrete-se e reflecte o cristal de dentro. Mas quem me suga, quem é fraco, que fique bem longe de mim pois de pedra faço demónio de todo o ódio que tenho à opressão e repressão e cobardias do senão! A dádiva que me é escrever... Tempo, só preciso de tempo e a minha mente reflecte o espírito como que jogando xadrez em campo divino. Calma, calma é o que me proponho alcançar. Vejo claro dos céus e calmo absorvo a vida como se morre-se a ela, voando. Depois, se tudo à volta, naturalmente, me cancela liberdade suprema eu revolto-me todo por dentro, meu espírito em guerra de querer fazer de meu corpo o seu. Domestico-o, é só. Domestico o meu espírito, não o mato. É aí que entra o valor de minha escrita. Faz-me o poder viver em liberdade absoluta, não oprimindo eu por, minha/sua vez, a repressão, opressão alheias pois cada um vive como vive. Eu deixo viver o outro porque consegui que o outro me deixasse viver como (se eu fosse) um outro. Coisa difícil de se fazer quando se vem de uma família católica/judia portuguesa... Vi o espírito pegar no meu corpo há uns dias e o manipular para o servir. Não sabe ele em que Era eu vivo... Civilização tecnológica e digital não é Era para se pensar em espírito nem espiritualmente. Eu isto hoje compreendo e aceito. Vivo aqui, neste corpo, neste local, neste espaço. Tenho que o viver. Então eu vivo tudo e proponho-me a tudo e aceito e como que compreendo tudo o que vejo, sinto e cheiro. Para quê guardar ódios? Para quê querer fugir do que não há que fugir? Para quê fazer sofrer quem já tanto sofre? Sou santo? Deus me livre! Apenas curioso e entusiasta da vida. Se os outros não vislumbram tanta beleza, problema deles. Hão de ver belezas que eu não conheço... Hão de saber e sentir coisas maravilhosas, quem sabe de uma forma mais maravilhosa que eu. Todos temos esta vida para viver. Não há culpas mas há responsabilidades. Devemo-nos cingir a quem nos ama e a quem amamos para poder, por vezes, ter espaço sincero para não amar, criando em seu lugar. Pois criar é uma festa aos Deuses. Criar é um dever de quem tem mais do que precisa. Viver a vida sem grandes futurismos, apreciando a cada momento o bom, o mau. Levá-los juntos ao encontro da arte e procriar filhos de pais livres. Que o demónio me dê forças para lidar com o mal e Deus as forças para lidar com o bem. Assim teremos uma vida simples e agradável. O mundo está em nós.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Ando muito fã de acreditar na vida, tanto esta que vejo como a potencialidade dela levada pelos meus sonhos. Não me quero mais demais abstrair da vida terrena. Quero viver o tempo do corpo - talvez porque hoje sei que sou universal e não tenho, com isto, nada a perder. Se, por agora, escrevo é só porque o não posso viver. Quero que a minha escrita aguarde comigo a minha vida e a não desvirtue numa outra demais interior. Sejamos práticos e criemos arte que mais não já procure que o derradeiro direito à vida!

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Arte é afirmação de vida, em que pese isto aos mórbidos. Afirmação de vida nesse sentido que a vida é a soma de todas as suas grandezas e podridões: um profundo silo onde se misturam alimentos e excrementos, e do qual o artista extrai a sua ração diária de energias, sonhos e perplexidades: a sua vitalidade inconsciente.
(...)
A arte não ama os covardes.
(...)
A arte, há que domá-la como a um miúra: e para tanto é preciso viver sem medo. Não a coragem idiota dos que se arriscam desnecessariamente, em franco desrespeito a esse terrível postulado da vida, que ordena uma preservação constante, de maneira a se estar sempre apto para os seus grandes momentos.

Vinicius de Moraes

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Da autoria de minha gente eu corro a sintonia dos campos, alegre com o vento eu morro a cada momento, vivo a loucura de me apaixonar pela vida sim! E os castigos do espaço querem-me agarrar, jogar, prender, matar. Mas quem sou eu senão um tocador de viola amador que escreve uns versos e sorri ao pássaro, ouve a gaivota, o mar. Os soluços do tempo entram-me a cada momento por poros que nem eu sei, como se fosse eu ar, ar da vida. Todo furado, alegria! Sou violado pela vida e amo isso! Põe-me maluco, é certo, porque há tanto a viver e tão pouco hoje que colher. Há o espaço da mente. Seguros os sentimentos na amplitude térmica do espírito.  Fui lá fora, joguei com amigos, mulheres e pessoas e voltando aqui, onde meu corpo repousa, fico louco. Quero novamente sair, ver a vida, ver o sol, brincar à harmonia como se fosse ela apenas uma brincadeira. Nasci de ti, nasci do incógnito conhecer que tudo é livre e pouco demais há a saber senão que somos todos filhos de Deus, irmãos então. No despertar de memória resolvida, eu solto como um jacto para a vida. Mas ela há onde não há e o meu ser precisa de efectivo viver. Real, virtual, tempo, espaço, arte ou corpo? Tudo é o mesmo pois é o Ser que vive e a vida é o nada que se expande por mais sectas do ser haver. No remoinho da loucura, sinto que expludo senão me acodem.
Quero decifrar todos os meus medos para os substituir por curiosidades infantis que fazem rir de divertimento o meu eu activo.
Farei da arte o útero da vida.
Olho ao lado
E parece que vejo quem não vi.


Travessas fechadas
E eu no acolá de ali.

Entra na rua a Joana
E fala o Pedro à Camila
Enquanto se ela evidencia.

Tropeçam-se orgulhos
Pela esquina –
É lá que estamos –
E largam-se sorrisos esforçados
Que lembram que há mais
Que amizade por aqui…

Todos se tocam.

A sexualidade
É então fulgurantemente
Disparada pela cabeça,
Corpo e membros!

Na rua de cima
Alguém grita à bófia
E na praça abaixo
Vende-se cocaína falsa.

Lisboa é a fauna do meu espírito.

A flora é o silêncio,
As gaivotas, o mar
E o horizonte.

Ontem falavas de amanhã.
Ao que eu te mal escutei,
Tão concentrado que estava nesse hoje que passou.

Espera-me a noite
Levada pela cerveja
Que de não careço preço.

Nunca sei o
Que me ela espera:
Um poema, um pensamento acertado,
Um amigo, uma menina.

Tudo e nada
Como jogador de casino:
Aposto na noite solitária por Lisboa.

Sempre me dá ela algo.

Se me logo
Não apercebo,
De ressaca, reflectindo,
Lá encontro sempre caminho oferecido.

Não há desgosto nesta vida
Porque a minha aposta não procura nada
Mas tudo.

Qualquer coisa serve.
Eu gosto de conhecer desconhecidos e desconhecer conhecidos.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Aguardar para sempre o impossível.
O melhor caminho não é aquele que é escolhido mas aquele que é levado.
“because you got to realize you can kill someone with kindness too.”

Bob Dylan

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Tenho que levar um fardo.

Este fardo
Que me aperta a vida.

Tenho de o levar
porque É onde estou.

E, descobrir O
onde não há,
É que acontece
Ele deixar de ser.

Vislumbres de uma harmonia
Por fazer.

Conversas que lembram,
Aos poucos,
O que há não além
Mas em mim.

Serei segredo
Até me alguém
Novamente descobrir.    

sábado, 3 de novembro de 2012

Talvez Platão tenha escrito a sua filosofia em diálogo
porque em grande medida é em diálogo interior
que o pensador pensa.

A tal esquizofrenia necessária à criação:
diálogo entre o lado masculino e o femenino do Eu.

O pensador mais não é, que um ser - uma criança -
que compreende que metade de si funciona sem si.
Quanto se mais É na realidade
Menos espaço Há para explorar em arte.


Quanto mais Há menos É.
Quanto mais É menos Há.
Para criar é preciso aprender a seduzir o ar, o espírito, a vida, para largar ela esse pó que faz voar.
Essa mesma sedução seduz também esse felino andante chamado Mulher.
Em metas de sentimento, eu encho o vazio de racionalidade, para que sentimento meu gere caminho e mapa de orientação. Aprendo com o que escrevo como se seguisse um percurso que me é dado. Meu pensamento racional é alienado mas o meu consciente que acaricia o sub-consciente que, por sua vez, alcança o inconsciente sabe de coisas que eu, por parecerem acertadas, aceito e uso no meu dia-a-dia. Para viver eu paro-me e "deixo-me" escrever. Aprendo comigo e vivo assim.
O passado é-me um abismo
De memórias guardadas
Em desgosto de as não corresponder no presente.

Fome.

Anseio pelo que vem.

Há Beleza na Surpresa da vida.
Viver, se se pensar,
É dificil de fazer.

Sejam os tempos
De sabedoria e calma
E o pensador de agora
Vira o sujeito activo.

O mundo move-se rápido,
Muito rápido,
E assim o pensador
Sente o dever
De parar um pouco o mundo.
(Para senti-lo lentamente.)

O tempo se move
Sempre igual:
Nasce-se e morre-se.

A actualidade é outra coisa...
Corre como uma danada contra a morte,
Pensando que a engana.

Mas a morte sorri-me
E diz que estou bem.

A vida evidencia-me
O erro
De assim pensar
E deturpa-me todo por dentro.

Já não tenho problemas com isso.
O meu mundo está na mente.

Lá, eu inauguro a vida
Por cada momento.


Sofrer demonstra
Que se está a fazer algo
Terrivelmente mal
Ou incrivelmente bem.

Eu estou no meio.
Noite de Inverno
Sussurra a chuva pelo cantinho
E o vidro
Se parte no lixo.

Na Era da utopia
Reconheço-me em erro
De Acreditar
E isto ser demais de virtual
Para sustentar
A minha ordem física.

Noite que adorna
Os meus soluços programados
Para gerar arte.

As exigências do mundo
Fogem então de mim finalmente.

Poesia querida
Que me guarda
E me afasta
Do mundo que me quer.

Quero todos longe
E só eu perto de mim.

Revoltado com o ser humano...
Como se pode ser assim?

Tanta coisa por resolver
E, no entanto,
Não o demonstro em
Qualquer atitude minha.

Como se fosse eu
De pedra.
Como se dela,
Da vida,
Eu nada desejasse...

Quem me queria,
Quem me quer...

Porquê?

Eu quero
Não querer nada.

E invento sempre
Possibilidades
Para disso me cercar.

Mentiras são as minhas verdades
E essas vossas verdades,
De me quererem,
Parecem-me falsas e maléficas.

Pois, quando pelo chão eu rastejava
Vi bem como tudo e todos se alarmam
E fogem disso como se isso não fosse verdade.

Aí vi
Que talvez as verdades do mundo
São afinal mentiras
E a unica verdade que existe
É aquela que me faz chorar de alegria
Por viver só
E ver toda esta maravilha!

O vosso afecto me cansa
Pois eu sou carente
Dos dedos dos pés
Até ao sonho mais alto.

Não compreendo esta vida
Que me foi roubada
Por tudo e por todos
Mas compreendo a Minha vida
Que sempre brota
Pura e cristalina.

Sou ainda uma criança.      
O sistema será destruído
quando se deixar de acreditar nele.